Pequenos bocados
Apesar das brincadeiras, é possível elencar algumas razões que explicam por que os pratos que muitos chefs promovem em seus perfis do Instagram sejam tão pequenos. A primeira delas diz respeito a uma questão matemática: comida é proporção. Até mesmo no nosso caso do espaguete à bolonhesa, a quantidade de molho e massa precisa ser equilibrada, senão a receita não fica boa.
Nos pratos mais requintados da alta gastronomia, essa regra se aplica ainda mais - até porque muitos dos ingredientes têm sabores muito potentes, e comê-los em grandes quantidades não seria prazeroso para nosso paladar.
O chef Rafael Costa e Silva, do restaurante carioca Lasai, diz que 70% dos pratos que serve são de 'pequenos bocados'. "Temos algumas criações que não poderiam ser comidas em pratos grandes. É o caso de uma batata envolta em cacau e especiarias: é um prato de sabor forte, um pouco picante e doce. Uma só é suficiente", afirma. Outro exemplo é uma torrada com lardo de peixe (barriga de peixe curada e defumada) que ele prepara. "O lardo é um pouco salgado e o paladar cansa se comer muito", explica.
Outra questão levada em conta pelo chef é a possibilidade de trabalhar com ingredientes de maior qualidade - como no caso dele, que mantém uma área para produzir muitos dos alimentos que usa nas receitas. "Acho que é uma possibilidade de eu poder servir o que tenho disponível nas minhas hortas sem me preocupar com a quantidade", diz. Isso significa que, por quase nunca ter grandes volumes dos ingredientes cultivados, ele prefere diminuir as porções, de forma a permitir usá-los para servir mais pessoas.imagem: Divulgação/facebook.com/restaurantelasaiQuestão de porção
No restaurante Tuju, em São Paulo, o chef Ivan Ralston também é um adepto dos pequenos pratos, que ele serve em sequência - na alta gastronomia, esse tipo de serviço ficou conhecido como "menu degustação", em que o comensal come um pouco de tudo, às vezes chegando a mais de 20 pratos servidos. Por isso, as porções têm que ser menores, para que o cliente chegue ao final do jantar ainda vivo.
No menu-degustação de Ralston, os oito primeiros pratos são porções pequenas, para comer com a mão. "A ideia é oferecer receitas leves para o cliente poder provar mais coisas que a gente faz, ao invés de comer um prato só", afirma. "O sistema de cardápio à la carte também torna difícil conseguir trabalhar com ingredientes frescos, já que é preciso manter um estoque alto."
A média consumida por um homem adulto é de 500g por refeição - para a mulher a quantidade é de 400g. Na maioria desses menus degustação essa quantidade é até superada, mas muitas vezes a percepção, pela quantidade ser servida em pequenas porções por mais tempo, é que não se comeu tanto. Pães, entrada, prato principal e sobremesa, em geral, atingem esse marco. O que muda é apenas a forma de dispor a refeição para o cliente, desmembrada em pequenas doses.
Claro que com isso, na maioria dos casos, muda também o preço - justificado por chefs e donos de restaurantes pelo valor mais caro de ingredientes e uma necessidade maior de serviço, já que o garçom precisa estar mais disponível para levar as muitas preparações à mesa, exigindo uma brigada maior.imagem: DivulgaçãoFartura à mesa
Como a alta gastronomia tem se tornado mais democrática, é normal que se estranhe essa mudança de perspectiva. "O brasileiro está acostumado com arroz, feijão, macarrão, salada, carnes variadas na mesma refeição, das quais as pessoas se servem a gosto. Esse era o padrão da classe média, antes de se aprofundar o comer fora", afirma Dória. Num país com muitas opções de restaurantes onde paga-se e come-se quanto quiser por quilo e rodízios de todos os tipos, fomos acostumados com a quantidade em detrimento da qualidade.
Para Diego Barreto, docente de gastronomia do Senac Penha, somos uma população acostumada com a abundância, sobretudo à mesa, dada a riqueza de ingredientes e de recursos alimentares do país. "Nela tem origem o costume da fartura que se tornou uma 'cultura' popular", acredita. Com o advento da gastronomia e a formação do paladar cada vez mais desenvolvido, estamos aprendendo que nem sempre mais é melhor. Barreto cita como exemplo o fenômeno das cervejas artesanais, que mudou o comportamento do brasileiro - que tem preferido tomar cada vez bebidas de qualidade (com mais aromas e sabores) do que as bebidas industriais a que estava acostumado. 'Isso se aplica também à gastronomia de uma maneira geral", diz. "Começamos a perceber e exigir qualidade em detrimento da quantidade", conclui.- Fonte: UOL
COMENTÁRIO
Gosto de boa comida em quantidade suficiente.
Dia desses me serviram 6 nhoques e me cobraram 70 reais!!!! E tem restaurante cobrando 50 por um prato de polenta. É abuso.
Já experimentei um jantar que me obrigou a comer um sanduíche em casa, mais tarde.
Quantidade suficiente é honesto, cobrar muito por pouco é abuso. escrevo como filho de dono de restaurante, cozinheiro e estudioso de gastronomia.
Não admito ser enganado num restaurante - seja ele de alta gastronomia ou não.
Cliente satisfeito deve ser a máxima de qualquer restaurante, no mundo todo.
Uma colherada de quirera, 4 pinhões e uns enfeites é roubo.
Nem sempre menos significa mais qualidade e sabor.
JJ